Síntese

(Escrito na data de postagem)

Mais um dia à procura de remédio, de libertação a este meu maligno.

Por ora caio em imaginário entusiasmo, quedando a pensar na magia em sair para viver… poucos instantes depois este ser bate nas trancas da consciência, invade meu desejo, coloca-lhe doenças e dúvidas, distorce aquilo que estava a nascer, mais uma vez o destino organizou-se para me dissuadir.

Luto constantemente com esta coisa, o outro eu que cultivei por anos, pensando ser a solução, ser a resposta… um outro eu que é forte, rude, indubitável, cruel, descontente e, acima de tudo, desanimado. Este meu demônio que tira meu desejo, leva consigo minhas energias e me bota em estado de inércia.

Este maldito não tem o poder para me fazer cair em tristeza profunda, porém consegue estagnar-me em ciclos de pensamentos, aprisionar-me na ideia que nada vale a pena, que tudo é desgastante e ausente de sentido. Esta é a razão para meu cansaço interminável, o peso enorme ao qual carrego, este embate interno que por anos desgasta-me ao extremo.

Convivo constantemente tentando combater meu outro eu, sendo este terceiro, mas também eu. Com isso, sempre caio em conflitos morais, em embates éticos, sendo que a máscara que ponho, dá o ponto de vista que vejo, muito além de pessimismo e otimismo, as coisas não são boas ou ruins, belas ou feias, grandes ou pequenas, importantes ou sutis, as coisas são. Apenas são. E conforme são, carregam consigo a complexidade, que pode ser interpretada como um lado da dicotomia, a depender de seu agente.

Hoje vejo como concordo com Russell¹, empenhando-me em não distinguir essa duplicidade. Hoje tento abraçar com toda força a contradição (quando ela se mostra necessária), muito melhor que ser reprimido pelos limites auto-impostos.

A beleza dos atos está naquilo que escolhemos ver, este mesmo lugar que estou, ora vejo como sujo, cercado por corrupção, deprimente, desgostoso. Todavia, posso escolher vê-lo como uma tentativa de refúgio à vida, onde detalhes podem ser achados e apreciados como a descoberta de um tesouro escondido.

Nós escolhemos a sinfonia da vida, os fatos apenas serão, não sendo duros ou leves, nem sendo difíceis ou fáceis demais, cabe a nós darmos o peso às coisas.

Depois de muito tempo me vejo vagando por pensamentos, e também, pelas calçadas, não tentando encontrar alguém, mas procurando por algo. Acredito que assim como a resposta para o problema da moral dúbia, procuro o mesmo, a vida.

Apenas a vida pode julgar algo, não há bem ou mal², há vida. E esta vida que procuro, decisões não devem ter moral, ética ou código de conduta como base, devem ter a vida como balança, que nada venha a ferir esta vontade de potência³. Que esta procura sem pistas termine em vida, em contos de eloquência.

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¹ Bertrand Russell

² ³ Friedrich Nietzsche