(Escrito na data de postagem)
Como bom pragmático tenho adversas interpretações e projeções ao falar de Inteligência Artificial. Quando no início da graduação me dediquei a estudar IA e ler alguns livros, por também ser um fã de xadrez isso veio bem a calhar, misturando o xadrez ao ápice da inteligência artificial dos anos 90, Kasparov que o diga. Ainda que admire motores, chatbots, sistemas especialistas e aplicações com IA que de fato são intrigantes, sempre fui muito pessimista em relação à real inteligência e sua limitação.
Por fim os últimos dois anos fizeram toda a indústria ser chacoalhada por esse assunto, fui me inteirar para ver o que estava perdendo, participei de eventos, palestras, conversei com pessoas da minha área e de outros campos, pesquisei por conta própria e tive conclusões em dicotomia.
Pois bem, realmente há um crescimento absurdo em investimentos em IA no cenário atual, empresas como a Nvidia tiveram aumentos imensuráveis ao focarem neste setor, o mundo ganhou inúmeros chatbots interativos que dão impressão de serem inesgotáveis em conhecimento e amplitude, as tecnologias de geração de imagem e processamento digital foram ressignificadas, vieram novas formas de estruturar análise de dados e estatísticas, também houveram mudanças nas ferramentas de design que tiveram avanços imensuráveis. Esse foi o lado bacana que pude perceber, porém…
Porém, vejo que formou-se uma histeria coletiva inimaginável, novamente o pensamento duma nova revolução industrial veio à tona, notei o atendimento ao cliente ser degradado em prol de corte de custos e inovação tecnológica forçada, vi diversos gurus bacanas proliferando asneira aos montes, percebi o quanto a formação se esconde por trás de informações incompletas e percepções medíocres em relação ao futuro das tecnologias e do mercado de trabalho.
Pois bem, dissequemos alguns desses pontos citados anteriormente, perdoe-me o pleonasmo, mas só reafirmando que se tratada apenas da minha opinião, não faço questão alguma de ser politicamente correto, polido, formal, institucional, atender aos interesses alheios ou ser agradável, dado o disclaimer, prossigamos:
- Histeria Coletiva: como qualquer tema da moda há demasiado exagero sobre a capacidade a curto prazo das IAs, temos por vezes o amplo público comentando deste tema como se a inteligência artificial já tenha se transformado na skynet, sendo nosso fim apenas uma questão de tempo, ou pior, como se em poucos anos a robótica viesse reconstruir tudo aquilo que temos hoje. Esses pensamentos de exterminador do futuro me fazem realmente rir, o domínio de dados dalgumas megaempresas já existe há muito tempo, quem rege as grandes IAs são instituições já tão conhecidas que há muito nos controlam, sendo a IA um meio, mas não a entidade que pode por si só determinará nosso fim, isso tem muito mais relação com políticas e interesses. Já aos fãs do Michael Jay Fox, então, melhor repensar em relação ao redesenho do mundo por conta do uso de IAs, ainda temos um gap absurdo entre IAs e robótica, termos éticos para autômatos são imensamente debatidos e travam inúmeras mudanças, não há como progredir sem todo o cuidado necessário. Imagino o futuro muito mais assistencial pela IA do que autônomo.
- Pensamento de Nova Revolução Industrial: Ora, não há como ignorar o fato que as IAs trazem uma mudança, há uma nova forma que o mercado de trabalho se organizará nos próximos anos. Odeio o falso otimismo de pseudo inovadores que pregam a adaptação como se fosse algo instantâneo, como se as pessoas de uma hora para outra se tornassem ao máximo resilientes, mudando sua forma de agir incorporando as IAs nos seus trabalhos, como se também os gerentes e donos de empresas só pensassem meramente no “ir além” ao invés do “corte de custos”. Obviamente a IA irá tirar pessoas de suas funções, qualquer estudo sociológio irá demonstrar isso, mas não vejo isso ocorrer sendo a IA uma criatura que ocupe cargos, todavia uma tecnologia que reduzirá a necessidade de tantos funcionários, sendo isto em determinadas áreas! Sobretudo, toda a gestão do uso dessas IAs, questões éticas, códigos empresariais, e claro, o “ir além” antes citado, também criarão novas lacunas, com isso novas funções e colaboradores terão de preenchê-las, enfim, o mercado se rearranja sempre, embora não vejo com uma coisa pessimista ou estusiasmante, apenas a forma que o mercado funciona desde a primeira revolução industrial, pois bem, siga Darwin, se adapte.
- Atendimento ao Cliente: Por raios, como odeio chatbots, odeio desde criança quando tinha de ligar para operadoras e caia no labirinto dos menus sem fim que nunca resolvem nada. Odeio interações com máquinas em boa parte do tempo, não me leve a mal, uso muito ferramentas generativas de conteúdo, só não gosto quando preciso resolver um problema específico e NÃO tenho como fazer isso sem passar por uma maldita IA. As empresas tem posto goela abaixo de suas estruturas a necessidade de implantações de IAs nos seus sistemas, serviços e atendimentos, contudo muitas dessas malditas implantações interferem na experiência do usuário de forma catastrófica. Uma boa construção com os clientes por meio de canais de atendimento “quentes”, forma a base de uma empresa que se importa com eles. Não estou demonizando o uso de IAs para ajudar em mensagens automatizadas e atendimentos, mas quando todo o workflow se prende a isso, faz com que inúmeros fluxos de excessão mal resolvidos se transformem em clientes detratores.
- Gurus: Impressiona-me como de tempos em tempos os gurus se realocam em seus “conhecimentos” e vão ensinar novas formas do mesmo, claro, para impactar é necessário o absurdo, o incabível, então sempre há um apelo intempestivo, hipersensacionalismo só me causa nojo e repulsa, odeio respostas curtas, pois são generalistas, não promovem debate, impressionam muitos por seu teor, contudo caem por terra já nas primeiras aplicações, sempre desconfie de soluções perfeitas, o mundo business é repleto de arco-íris, mas se quer realidade, saiba equilibrar fatores acadêmicos com estudos de casos, tudo que necessita de muito marketing para ser provar, bem, é frágil.
Eu poderia muito bem discorrer sobre os tantos benefícios que a IA trouxe, mas todo mundo que fala de IA já faz isso, seria chover no molhado, como alguém de formação de Gestão e Tecnologia, não poderia deixar de estar empolgado, contudo o que me cansa não são projeções e encaixes da tecnologia, o que me frusta é a falta de senso crítico em correr atrás e repensar aquilo que recebemos, odeio pessoas-espelhos que vivem a refletir cartilhas, pensamento elaborado deve vir de teorias, empirismo e suor, no demais há muitos tentando apenas vender seu peixe de forma travestida, reflita antes de absorver.