Deglutir

(Escrito em: 2 de Julho de 2024)

Outra vez em exílio, mas em última sinfonia,
Vou sentindo as cordas puxando, a me levar.
Tal como vírus, esta música contamina,
Rasga meu rosto, fura os olhos a acalentar.

Sou posto a mesa amarrado em lástimas.
Amputando meus dedos e karmas, Valefar,
Conquanto o último anjo desistiu remendar.

Engulo o abandono final, etérea frustração.
Ressonância em mente, logo interrompida,
Pressinto um novo ser, pouco a se aproximar.

Lapidando minha carne, dreno pranto vermelho,
Pontiagudas miscelâneas deturpam cada órgão,
Enquanto a criatura lambe, degusta minha pele,
Talvez apenas seja o vestígio findo de desejo.

Sinto o sopro de suas palavras ecoarem
Sem verbo algum pronunciar, lacônico.
Medo já não me afeta, se tornou primário,
Aquilo que sinto é diverso, apenas infernal.

Engolindo as próprias vísceras assim,
Sequer há raciocínio para sentir estar,
Morro em partes, garras sufocam a goela.
Leve-me! Já sou de vocês, nem posso evitar
E que meu consumo seja agradável, maldito!

Já não há resquício de interpretação,
Mal ou razão fazem em vão denotação.
Só leve-me para onde não resta sentir,
Nem que de minh’alma precise deglutir.